ConfissõesSociedade das Ciências Antigas - 44 páginas JACOB BOEHME, que nos revela aqui alguns dos segredos de sua vida interior, foi um dos mais originais dentre os grandes místicos Cristãos. Possuidor de um gênio natural para tudo que se refere ao espírito, Boehme também apresenta muita das características de uma mente visionária; sua influência na filosofia tem sido, no mínimo tão grande quanto sua influência no misticismo religioso. Nenhum místico nasce formado. Boehme foi, como os outros homens, o produto tanto da educação como da natureza. A Tradição e o ambiente condicionaram sua visão e forma de pensar. Sua difícil e, porque não dizer, peculiar doutrina é mais bem compreendida quando se lança um olhar sobre sua vida exterior e as influências recebidas. Nasceu numa família de camponeses em 1575, em uma vila perto de Görlitz, nos arredores da Saxônia e da Silesia; quando menino era lavrador. De uma disposição meditativa, sonhadora e piedosa, mesmo na infância já tinha experiências visionárias. Como não era forte o suficiente para o trabalho no campo, passou a ser aprendiz de sapateiro; contudo, suas rígidas idéias morais provocaram discussões com um outro trabalhador, Boehme foi dispensado e se tornou um sapateiro ambulante. Durante seu exílio forçado, que coincidiu com o mais impresionável período da juventude, aprendeu algo sobre a insatisfatória condição religiosa de seu tempo: as amargas discussões e a intolerância mútua que dividiam a Alemanha protestante e o formalismo vazio que se passava por Cristianismo. Entrou em contato com especulações teosóficas e herméticas que colocavam o pensamento alemão contemporâneo em destaque, e que para muitos parecia oferecer um escape para regiões mais espiritualizadas do que as encontradas nas ilusões das instituições religiosas. Ele próprio encontrava-se cheio de dúvidas e de conflitos internos. Torturado não só pela ânsia de uma certeza espiritual, mas também pelos impulsos desordenados e desejos passionais da adolescência – aquela “poderosa contrariedade” da qual ele tanto comenta – era freqüentemente sentida pelo místico em sua forma mais exagerada. Suas necessidades religiosas eram simples: “Nunca desejei saber nada sobre a Divina Majestade... busquei apenas o coração de Jesus Cristo, para que pudesse me ocultar ali da terrível cólera de Deus e dos violentos assaltos do Demônio”. Do mesmo modo que Santo Agostinho em seu estudo sobre os Platônicos, Boehme buscava “um lugar que não fosse apenas uma visão, mas um lar”; com isso ele já demonstrou ser um verdadeiro místico. Sua ânsia e esforços para alcançar a luz foram recompensados, do mesmo modo como geralmente acontece com os buscadores no começo de suas investigações, por uma intuição da realidade, aliviando por um tempo a desarmonia que o atormentava. O Conflito cedeu lugar a um novo sentido de estabilidade e a uma “paz abençoada”. Isso durou por sete dias, durante os quais se sentiu “cercado pela Luz Divina”: uma experiência paralela às vividas por muitos outros contemplativos. |