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que a descripção na carta iv do mau poeta que inventa vozes novas, é allusiva a Camões, e é bem singular que na vII, escripta depois do anno de 1558, em a qual enumera a Pedro de Lemos, para os louvar, tantos nomes dos claros lumes das Musas portuguezas, como lhes chama, o nome de Camões, aindaque ausente, seja omittido, quando por este tempo a sua fama como poeta lyrico devia estar estabelecida; o soneto que depois dirigiu ao Poeta, pelo seu principio dá a entender que fôra convidado a escreve-lo, sendo porém, é preciso confessa-lo, de encarecido louvor. Se não falha a conjectura, Caminha, poeta mediocre, aguçou um feixe de epigrammas que dirigiu contra o peito do Poeta 1, mas que mal podiam roçar-lhe as roupas. É porém singular que todos estes poetas tinham estreito trato com os amigos mais intimos de Camões; o mesmo censor das obras de Caminha era o discreto padre fr. Bartholomeu Ferreira, ao qual devemos possuir os Lusiadas sem amputações nem deturpados. O mesmo silencio relativamente ao Poeta se nota em Pedro Sanches, o qual na sua epistola ad Ignatium de Moraes, em a qual faz menção de tantos poetas portuguezes, só o nome de Camões foi esquecido; mas é preciso dizer-se que esta carta é um fragmento, e assim não pode plenamente ser accusado.

D'estes Bavios e Zoilos do Poeta 2 nos dá noticia o seu contemporaneo e amigo Fernão Alvares do Oriente, na prosa x, na qual descreve o Templo da Poesia onde elles jaziam aos pés da estatua do Poeta que pretendiam em vão derrubar. De todos os contemporaneos aquelle que partilhou mais enthusiasmo e predilecção por Camões, foi sem duvida Fernão Alvares; os mesmos sentimentos animaram a João Lopes Leitão e outros. Dos poetas que nos podiam dar mais largas informações perderam-se as obras; das de D. Manuel de Portugal apenas restam algumas asceticas; de João Lopes Leitão o soneto que se lhe attribue em louvor do amigo, uma pequena poesia nas obras de Caminha, e uma carta em prosa, manuscripta, que conhecemos; de Heitor da Silveira apenas conheciamos o memorial que dirigiu na India ao Conde de Redondo, agora algumas poesias nas obras de André Falcão de Resende que se imprimem em Coimbra; e de D. Gonçalo Coutinho uma unica canção tambem manuscripta: as suas obras porém se conservavam na livraria do Duque de Lafões.

D'entre os detractores que appareceram no seculo seguinte aquelle

1 Vide nota 95.a

2. Vide nota 96."

em que falleceu o Poeta (xvi), o que mais ousadamente se apresentou em campo foi o licenceado Manuel Pires de Almeida, que escreveu uma critica sobre a visão do Indo e Ganges; porém promptamente achou em João Franco Barreto um denodado campeão que desembainhasse a espada em defeza do seu mestre.

Em nosso tempo um homem, aliás de grande litteratura, o padre José Agostinho de Macedo empregou as armas do sarcasmo e do ridiculo que tão magistralmente sabia exercer para derrubar a fama do nosso Poeta, querendo sobre a sua ruina levantar um novo monumento; porém, baldado na tentativa, veiu quebrar as suas loucas e vaidosas pretenções contra o pedestal onde repousa inabalavel a estatua do Principe dos poetas portuguezes. Na verdade não sei que possa ser de maior elogio para o primeiro Epico portuguez, do que um homem de tantos conhecimentos ficar tão microscopico ao pé do nosso Poeta.

Elle porém, quaesquer que sejam as criticas, não fallo d'aquellas quando dormita o bom Homero, zomba d'ellas, porque a sua fama passando já através dos seculos não pode ser abalada, e não carece de elogios, porque, como bem o disse depois melhor aconselhado o poeta Bernardes:

Elle só a si se louva em toda a parte.

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