Ve do Benomotápa o grande imperio, De selvatica gente, negra e nua, Onde Gonçalo morte e vituperio Padecerá pela Fé sancta sua: Nasce por este incognito hemispherio O metal por que mais a gente sua: do lago, donde se derrama O Nilo, tambem vindo está Cuama.
Olha as casas dos negros, como estão Sem portas, confiados em seus ninhos, Na justiça Real e defensão,
E na fidelidade dos vizinhos:
Olha delles a bruta multidão,
Qual bando espesso e negro de estorninhos, Combaterá em Sofala a fortaleza.
Que defenderá Nhaia com destreza.
Olha lá as alagoas, donde o Nilo Nasce, que não souberam os antigos; Vê-lo rega, gerando o crocodilo, Os povos Abassís, de Christo amigos: Olha como sem muros (novo estilo) Se defendem melhor dos inimigos: Vê Méroe, que ilha foi de antigua fama, Que ora dos naturaes Nobá se chama.
Nesta remota terra, hum filho teu Nas armas contra os Turcos será claro; Ha de ser Dom Christovam o nome seu; Mas contra o fim fatal não ha reparo. Vê cá a costa do mar, onde te deu Melinde hospicio gasalhoso e charo: O Rapto rio nota, que o romance Da terra chama Oby, entra em Quilmance.
O cabo vê já Arómata chamado, E agora Guardafú, dos moradores, Onde começa a boca do afamado Mar Roxo, que do fundo toma as cores. Este como limite está lançado,
Que divide Asia de Africa, e as melhores Povoações, que a parte Africa tem, Maçuá são, Arquico e Suanquem.
Vès o extremo Suez, que antiguamente Dizem que foi dos Héroas a cidade; Outros dizem que Arsinoe; e ao presente Tem das frotas do Egypto a potestade. Olha as aguas, nas quaes abrio patente Estrada o grão Moysés na antigua idade: Asia começa aqui, que se apresenta Em terras grande, em reinos opulenta.
Olha o monte Sinai, que se ennobrece Co'o sepulchro de Sancta Catharina: Olha Toro e Gidá, que lhe fallece Agua das fontes doce e crystallina: Olha as portas do estreito, que fenece No reino da secca Ádem, que confina Com a serra d'Arzira, pedra viva, Onde chuva dos ceos se não deriva.
Olha as Arabias tres, que tanta terra Tomam, todas da gente vaga e baça, Donde vem os cavallos para a guerra, Ligeiros e feroces, de alta raça. Olha a costa, que corre até que cerra Outro estreito de Persia, e faz a traça O cabo, que co'o nome se appellida Da cidade Fartaque ali sabida.
Olha Dofar insigne, porque manda O mais cheiroso incenso para as aras: Mas attenta, já cá de est'outra banda De Roçalgate, e praias sempre avaras, Começa o reino Ormuz, que todo se anda Pelas ribeiras, que inda serão claras Quando as galés do Turco, e fera armada. Virem de Castel-Branco nua a espada.
Olha o cabo Asabóro, que chamado Agora he Moçandão dos navegantes: Por aqui entra o lago, que he fechado De Arabia, e Persias terras abundantes. Attenta a ilha Barem, que o fundo ornado Tem das suas perlas ricas e imitantes Á côr da Aurora; e vê na agua salgada Ter o Tygris e o Euphrates huma entrada.
Olha da grande Persia o imperio nobre, Sempre posto no campo, e nos cavallos, Que se injuria de usar fundido cobre, E de não ter das armas sempre os callos. Mas vê a ilha Gerúm, como descobre
que fazem do tempo os intervallos;
Que da cidade Armuza, que ali esteve,
Ella o nome despois e a gloria teve.
Aqui de Dom Philippe de Menezes Se mostrará a virtude em armas clara, Quando com muito poucos Portuguezes Os muitos Párseos vencerá de Lara. Virão provar os golpes e revezes De Dom Pedro de Sousa, que provara Já seu braço em Ampaza, que deixada Terá por terra á força só de espada.
Mas deixemos o estreito e o conhecido Cabo de Jasque, dito já Carpella, Com todo o seu terreno mal querido Da natura, e dos dões usados della: Carmania teve já por appellido: Mas vès o formoso Indo, que daquella Altura nasce, junto á qual tambem D'outra altura correndo o Gange vem.
Olha a terra de Ulcinde fertilissima, E de Jaqueta a intima enseada; Do mar a enchente subita grandissima, E a vasante, que foge apressurada. A terra de Cambaia vê riquissima, Onde do mar o seio faz entrada: Cidades outras mil, que vou passando, A vós outros aqui se estão guardando.
Vês corre a costa celebre Indiana Para o Sul, até o cabo Comori, Já chamada Cori, que Taprobana (Que ora he Ceilão) defronte tem de si. Por este mar a gente Lusitana,
Que com armas virá despois de ti,
Terá victorias, terras e cidades,
hão de viver muitas idades.
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